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ID: 2690

Filipenses 4.1-9

Auxílio Homilético

15/10/2017

 

Prédica: Filipenses 4.1-9
Leituras: Isaías 25.1-9 e Mateus 22.1-14
Autoria:  Renato Küntzer
Data Litúrgica: 19º. Domingo após Pentecostes
Data da Pregação: 15/10/2017
Proclamar Libertação - Volume: XLI

1. Introdução 

O conjunto de textos indicados para o 19º Domingo após Pentecostes convida as comunidades para celebrar a vida a partir da revelação de Deus, que se caracteriza pela justiça que condena o opressor e salva o fraco e indigente, culminando com a promessa de uma experiência de comunhão universal de todos entre si e com Deus (Is 25.1-9). Essa esperança é recontada por Jesus de Nazaré por meio de uma parábola (Mt 22.1-14). As lideranças e autoridades religiosas e políticas, comprometidas com o sistema que privilegia os interesses pessoais, rejeitam o convite à festa de casamento que representa a aliança para a formação do novo povo de Deus. O convite é então dirigido aos pequenos, fracos e marginalizados. Inclusive a participação desses é condicionada a estar devidamente preparados. Há que se ter firmeza e sobriedade no testemunho da fé, porque esse nos é concedido por graça de Deus. Na comunidade, não há espaço para a banalização do testemunho, mas ela necessita estar animada a continuar firme o seu serviço.

2. Exegese

Na opinião de vários exegetas, o texto indicado para a pregação reúne e mescla partes de duas cartas independentes escritas por Paulo à comunidade de Filipos. Os v. 2-7, em sua origem, seriam parte de uma segunda carta, enquanto os v. 1, 8-9 teriam sido parte de uma terceira e última carta. O texto é, portanto, resultado do trabalho redacional do autor final da carta, que agrupou, nesse texto específico, parte de duas cartas. Segundo a hipótese de que a Carta aos Filipenses é o resultado final da junção de três diferentes cartas, elas podem ser identificadas da seguinte forma:

Primeira carta: Fp 4.10-20

Segunda carta: Fp 1.1-3.1a e 4.2-7,21-23

Terceira carta: Fp 3.1b-4.1 e 4.8-9

Parte do texto (4.2-7) pertence à segunda carta, escrita por Paulo a partir da experiência da prisão. É escrita sob a experiência da cruz, trazendo aspectos do receio da morte ou da esperança da libertação (1.22). Tem a preocupação central e a tarefa de deixar clara a verdade do evangelho, centrada na cruz de Cristo e nas consequências na vida missionária do próprio Paulo. A mais bela formulação desse evangelho encontramos no hino cristológico (2.6-11). Paulo aponta para o que define como a autenticidade do evangelho, motivo pelo qual está preso, pelo qual inclusive aceita morrer, mas pelo qual também expressa a esperança de conquistar a liberdade e continuar a tarefa missionária.

A outra parte do texto (4.1,8-9) faz parte de uma terceira e última carta, que envolve uma polêmica contra adversários de Paulo e do evangelho da cruz. Há denúncias contra erros provocados pelos adversários. Os adversários de Paulo são missionários cristãos de origem judaica. São acusados de desviar-se do evangelho, anunciando assim obras/milagres extraordinários, e divulgar uma visão triunfalista de Cristo, tendo por fundamento a ressurreição. Para Paulo, não há verdadeiro evangelho fora da cruz de Cristo. O caminho da comunidade é o caminho da cruz. A boa-nova a ser anunciada pela comunidade cristã é o escândalo da cruz. Qualquer outra pregação é tratada como inimiga da cruz.

O que dá unidade ao nosso texto é a afirmação de que Jesus Cristo é o caminho da cruz. Não há outro que possa ser pregado sob o risco de falsificar/ deturpar o evangelho senão o Jesus Cristo crucificado.

O texto indicado para a pregação caracteriza-se por agrupar uma série de breves recomendações e conselhos. Inicia com uma exortação à comunidade para que ela permaneça firme na graça de Deus, na qual foi chamada pela evangelização (4.1). A exortação para que permaneçam firmes no Senhor é para que a comunidade continue a conduzir a sua vida de modo que corresponda ao evangelho de Cristo. Disso brota o sentimento de alegria e vitória para Paulo. A condição já está dada pela pregação do evangelho feita por Paulo e seus colaboradores. Agora é só permanecer firme no evangelho.

Possivelmente, a exortação leve em conta uma situação de conflito envolvendo duas mulheres e líderes da comunidade. Evódia e Síntique são chamadas a fazer as pazes, entrando em acordo e entendimento mútuo. Isso é necessário, pois se trata de duas mulheres cuja liderança é importante na comunidade, visto que ambas lutaram junto com Paulo na evangelização, a ponto de seus nomes estarem no livro da vida. Para isso, Paulo sugere que Sízigo (que Almeida não traduz como nome próprio e sim como referência a um colaborador: “fiel companheiro de jugo” – v. 3), seu fiel colaborador, ajude-as.

Após tratar dessa questão específica de conflito entre líderes, Paulo faz uma série de breves recomendações e conselhos à comunidade: “Fiquem sempre alegres no Senhor” (v. 4); “Que a bondade de vocês seja notada por todos” (v. 5); “Não se inquietem com nada. Apresentem a Deus todas as necessidades de vocês através da oração e súplica, em ação de graças” (v. 6).

Alegria por causa do evangelho, bondade na relação com os outros e oração como serviço diante das necessidades. Eis aqui a medida, o equilíbrio e o bom critério para a vida comunitária, porque o Senhor está próximo (v. 5b). É o que permite a expressão do desejo de paz no v. 7. A presença antecipada de Cristo na comunidade é real pela firmeza no evangelho, pela alegria na fé e na prática da bondade e da oração.

Quando se esperava que as recomendações tivessem terminado, Paulo retoma citando uma série de adjetivos que devem identificar os cristãos (v. 8-9). Enumera uma série de virtudes que têm sua origem na moral popular romana. São valores da vida social e do ambiente das cidades romanas adotados para a comunidade cristã. Paulo mostra que está aberto à sociedade circundante com aquilo que ela tem de bom. Também os valores da sociedade circundante, fora do ambiente comunitário, podem ajudar pessoas cristãs a qualificar o seu discernimento. A pessoa cristã encontrará na sociedade os elementos que a ajudarão em seu caminho de evangelização e testemunho, sempre sob o cuidado de julgar todas as coisas, apropriando-se apenas do que é bom.

3. Meditação

Em tempos da banalização da fé por meio da teologia da prosperidade, da pregação repetida e em forma de mantra de chavões teológicos cristãos, nada mais sóbrio do que ser remetido pelas recomendações de Paulo à vivência da fé para dentro da realidade de uma comunidade. Paulo elogia e cobra da comunidade de Filipos a fidelidade ao evangelho da cruz e do esvaziamento de toda forma de manifestação de poder. A autenticidade do evangelho, anunciado e vivido, está na cruz de Cristo (Fp 2.5-11). Há uma demonstração de afeto e gratidão pela comunidade que coopera e participa do trabalho, anunciando, defendendo e confirmando o evangelho.

Não há evangelho na teologia de prosperidade nem em chavões teológicos e tampouco numa pregação triunfalista e gloriosa do Cristo.

A proposta comunitária é viver a teologia da cruz, o esvaziamento diante de toda forma de poder e domínio. A comunidade é chamada a ter os mesmos sentimentos que havia em Cristo, que se esvaziou a si mesmo, tornando-se servidor. Isso certamente nos obriga a ser críticos com nossos modelos e práticas comunitárias, a fazer uma releitura de nosso testemunho público a partir do conteúdo de nossas mensagens e corrigir as nossas práticas comunitárias e pessoais, tendo em vista a realidade que nos cerca. Não queremos divulgar e tornar público um conjunto de crenças e doutrinas, reunir-nos isolados e separados do mundo em pequenos grupos e instituições confessionais. Desejamos consolidar-nos como comunidades daqueles e daquelas que decidiram engajar-se no seguimento de Jesus. Nosso lugar na sociedade vai definir o anúncio, a defesa e a confirmação do evangelho.

Não estamos na condição de espectadores do evangelho, mais propriamente definido por Paulo como evangelho da cruz e do esvaziamento de Cristo. Somos envolvidos nessa experiência mediante a fidelidade a esse evangelho.

“Por isso somos ensinados aqui a crer contra a esperança na esperança; essa sabedoria da cruz está hoje por demais oculta em mistério. Também para o céu não há outro caminho do que essa cruz de Cristo. Por isso é preciso precaver-se, para que a vida ativa com suas obras e a vida contemplativa com suas especulações não nos seduzam. Ambas são extremamente atrativas e tranquilas, e por isso também perigosas, até que sejam temperadas pela cruz e perturbadas pelas adversidades. A cruz, no entanto, é de todas as coisas a mais segura. Bem-aventurado quem entende” (Martim Lutero).

Segundo Lutero, o que é atrativo e tranquilo necessita ser temperado pela cruz e perturbado pelas adversidades. 

4. Imagens para a prédica

Penso que a melhor maneira de atender os conselhos de Paulo (ter alegria na fé e ser motivo de alegria para outras pessoas) é que a comunidade e cada pessoa que dela participa exercitem gestos samaritanos. A comunidade necessita de pessoas que façam a diferença no atual contexto da sociedade. Partilho duas imagens que nos podem ajudar a encher a nossa mente com tudo o que é bom e merece elogios.

4.1 – Que tens na tua mão?

– Que tens na tua mão, Moisés?
– Apenas um bordão, Senhor. Com ele eu guardo o meu rebanho.
– Toma-o e usa-o no meu serviço!
O homem de Deus fez conforme o Senhor lhe pediu. E aconteceram maravilhas tais que os egípcios e o faraó jamais tinham visto.
– Que tens na tua mão, viúva pobre?
– Apenas uma moeda, Senhor. É tão pouco, mas o que tenho é para ofertar em favor do serviço do templo.
E ela a deu ao Senhor, e seu sacrifício tem servido de inspiração durante os séculos para cristãos de todo o mundo.
– Que tens na tua mão, Tabita?
– Somente uma pequena agulha, Senhor.
E os pobres de Jope foram agasalhados com as roupas que ela fez.
– E tu, o que tens na tua mão?

4.2 – O protagonismo de uma mulher

Tereza é uma mulher agricultora e pescadora, ribeirinha do rio Uruguai. Desde dezembro de 2010, além de se preocupar com as questões cotidianas que envolvem a agricultura camponesa, ela está envolvida em um pesadelo. Ela é uma das milhares de pessoas do meio urbano e rural que receberam a notícia da construção da barragem binacional Panambi. As preocupações do cotidiano tornaram-se pequenas e insignificantes diante de tamanho risco. Eu a conheci na primeira reunião promovida pelas igrejas (IECLB e ICAR), sindicatos (STR) e Movimento de Atingidos por Barragens (MAB). Em uma das primeiras manifestações públicas contra as barragens e em defesa dos direitos das famílias ameaçadas pela barragem, foi solicitado que alguém ameaçado se manifestasse diante do poder público. Ela foi escolhida. Até ali, a vida da Tereza envolvia a sua comunidade local, a comunidade religiosa, o envolvimento partidário nas eleições locais. Preocupada e nervosa, antes de se dirigir ao microfone, pediu-me: O que eu falo? Respondi: Fala com o coração. Desde lá, Tereza tem falado com o coração das coisas que a preocupam e que têm dificultado a vida de tantas outras mulheres e famílias, atormentadas diariamente pela ameaça da perda da propriedade, da sua vida comunitária, do seu lazer, do seu lugar no mundo. É lutadora, corajosa e protagonista. Fala em defesa do rio Uruguai, pela permanência dos camponeses e agricultores em suas propriedades. Fala em defesa das mulheres e do espaço para o exercício de sua cidadania. Tornou-se uma protagonista no MAB e sente-se agredida quando agentes públicos a tratam como uma qualquer sob a promessa de que ela não precisa estar envolvida nessa luta desgastante e sob ameaça de criminalização, quando eles podem tratar de seus problemas e defendê-los. Ela descobriu a capacidade de fazer a sua história, e dentro dessa construção cabem valores como dignidade, direitos humanos, protagonismo, igualdade de gênero, voluntariado. Apesar de todas as preocupações, ameaças e derrotas e de algumas pequenas conquistas e vitórias, sempre a vejo alegre. E essa alegria faz de sua fala leve e mansa uma manifestação em favor da vida.

Bibliografia

BARTH, Gerhard. A Carta aos Filipenses. São Leopoldo: Editora Sinodal, 1983. COMBLIN, José. Epístola aos Filipenses. Petrópolis: Editora Vozes, 1985.


 

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Autor(a): Renato Küntzer
Âmbito: IECLB
Área: Celebração / Nível: Celebração - Ano Eclesiástico / Subnível: Celebração - Ano Eclesiástico - Ciclo do Tempo Comum
Área: Governança / Nível: Governança - Rede de Recursos / Subnível: Governança-Rede de Recursos-Auxílios Homiléticos-Proclamar Libertação
Natureza do Domingo: Pentecostes
Perfil do Domingo: 19º Domingo após Pentecostes
Testamento: Novo / Livro: Filipenses / Capitulo: 4 / Versículo Inicial: 1 / Versículo Final: 9
Título da publicação: Proclamar Libertação / Editora: Editora Sinodal / Ano: 2016 / Volume: 41
Natureza do Texto: Pregação/meditação
Perfil do Texto: Auxílio homilético
ID: 45500

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1Reis 8.57
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